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PEC da Blindagem expõe indisposição entre Motta e Alcolumbre, incomoda deputados e ameaça dosimetria
Geral 27/09/2025 11:46 Fonte: O TEMPO Por: O TEMPO Relevância: 15

PEC da Blindagem expõe indisposição entre Motta e Alcolumbre, incomoda deputados e ameaça dosimetria

BRASÍLIA - A rejeição unânime à proposta de emenda à Constituição (PEC) da Blindagem no Senado fragilizou o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), diante do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e expôs deputados federais.
A relação entre eles azedou. As dívidas de Motta com partidos do centro à direita se acumulam com promessas postas em xeque, e parlamentares questionam se o presidente da Câmara mentiu ou se Alcolumbre o traiu.
Na articulação com os líderes das bancadas, Motta recorreu a diferentes estratégias. Para o PL, prometeu colocar a anistia em votação em troca de apoio à PEC. Agiu ao contrário com o PT, indicando a derrubada da anistia no plenário se a base votasse com o centrão para aprovar a proposta. Aos deputados de centro foi dito que havia um acordo celebrado com Alcolumbre para garantir o aval dos senadores à blindagem.
A pressão não se restringiu às promessas, e um clima de chantagem se instalou entre as bancadas. Os partidos do centrão fecharam questão para obrigar que todos os deputados do grupo votassem pela aprovação da PEC, ameaçando direta e indiretamente quem não manifestasse apoio.
Em xeque, estavam o pagamento de emendas e liberação de recursos do fundo partidário. Parlamentares contrários à PEC dizem que foi preciso colocar na balança: era melhor sofrer com as críticas do eleitorado ou com as retaliações do partido que poderiam impedir até a continuidade do mandato?
Ligações de Motta
O próprio Motta mergulhou na campanha pelos votos. Sentado à mesa da presidência enquanto a discussão acontecia, ele telefonava para deputados pedindo votos para a PEC. O PL ameaçou cortar os cargos comissionados de parlamentares que não votassem. A promessa era reforçada em grupo no WhatsApp: o partido entregaria seus votos em troca da aprovação da anistia. A pressão produziu os efeitos desejados. Só o PT roeu a corda, lançando os deputados da base às cobranças dos eleitores.
A PEC passou com 353 votos favoráveis, atropelando os 134 contrários. O Senado prometeu enterrar a PEC e Alcolumbre decretou o funeral no plenário cinco dias depois. Deputados avaliam que o golpe fatal do presidente do Congresso expôs a Câmara: os senadores saíram como defensores da Justiça, enquanto sobrou para os deputados o rótulo de "apoiadores da bandidagem".
"Ficou muito ruim. Os deputados se sentiram usados e sofreram com a perda de popularidade, enquanto os senadores saíram como heróis", avaliou um parlamentar de centro. "Nós nos sentimos traídos porque os partidos fecharam questão e nos obrigaram a votar na PEC, e a carga negativa ficou para a Câmara", completou.
Aliados de Motta atribuem o problema a Alcolumbre. "O Davi fez uma m*rda", tratou um parlamentar próximo ao presidente da Câmara. A situação não foi melhor no PL. "Foi uma posição infeliz da bancada. Mas, o acordo é a blindagem em troca da anistia. Ou o Hugo Motta não costurou um acordo com Alcolumbre, como disse que tinha costurado, ou o Davi não se envolveu tanto quanto deveria", analisou.
Racha exposto
A divisão entre as posições de Motta e Alcolumbre expôs um racha entre eles. Tratado como um dos fiéis da balança do presidente da Câmara, uma liderança importante avaliou que Motta não colocaria a PEC em votação sem o consentimento de Alcolumbre.
"Não sei se Alcolumbre está rompendo com Motta. Apenas rompeu um acordo. Motta não colocaria para votar sem acordo", afirmou. Aliados têm recorrido a exemplos de dobradinhas efetivas entre Câmara e Senado, como a tentativa de derrubada do decreto do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e o aumento no número de deputados.
Outros parlamentares põem em xeque a validade do acordo dito por Hugo Motta. "Se tinha ou se não tinha acordo não dá para cravar. Fato é que agora não dá para votar mais nada", analisou um deputado. "A gente sabe que a anistia geral não vai acontecer. Estamos com o sentimento de que fomos traídos pelo Hugo. Engolimos a PEC à força, não tem defesa, mas ele foi longe demais", completou.
Para interlocutores do Senado, Alcolumbre, enquanto presidente, tinha ciência de que Motta pautaria a PEC da Blindagem. Avaliam até que tanto o senador quanto o deputado federal sabiam que o texto não teria maioria na Casa Alta, já que presidentes não levam matérias como esta ao plenário sem ter os votos contados.
O erro atribuído a Motta é a condução da tramitação da PEC. Segundo os interlocutores, o presidente da Câmara deveria ter atribuído a iniciativa de pautá-la a uma decisão do Colégio de Líderes e ponderado que a palavra final caberia ao Senado enquanto Casa revisora. A observação é que faltaram conselheiros ao deputado federal.
Em coletiva à imprensa na quinta (25/9), Motta pôs panos quentes e negou uma eventual traição do Senado ao derrubar a PEC da Blindagem. "Até porque temos condição de saber que não obrigatoriamente uma Casa tem que concordar 100% com aquilo que a outra aprova. Já tivemos vários episódios em que o Senado discorda da Câmara, e a Câmara, do Senado", minimizou.
Tentativa de independência
A tensão entre Motta e Alcolumbre ocorre ainda em meio a alertas ao presidente da Câmara para tentar se tornar independente do presidente do Senado. Desde o motim da oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), deputados federais têm aconselhado Motta a se blindar através de um grupo próprio.
Para os deputados federais que lhe aconselharam, Alcolumbre, pela experiência de já ter sido presidente do Senado em outro momento, poderia tentar ter uma ascendência sobre Motta. Além do senador Ciro Nogueira (PP-PI), são hoje considerados próximos ao presidente o líder do PP, Dr. Luizinho (RJ), o líder do MDB, Isnaldo Bulhões Jr. (AL), e o líder do União Brasil, Pedro Lucas (MA).
A rejeição do Senado à PEC da Blindagem já reflete na proposta para reduzir as penas previstas para os crimes dos condenados pelos ataques aos edifícios-sede dos Poderes em 8 de janeiro de 2023. Até a última quarta (24/9), havia a expectativa de que Motta levasse o texto ao plenário na próxima terça-feira (30/9), antes da isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil.
Entretanto, o relator, Paulinho da Força (Solidariedade-SP), afirmou que a proposta será pautada por Motta apenas depois de ter a anuência de Alcolumbre. "Davi tem que dar garantias de que vai pautar o projeto de lei da dosimetria", apontou. Paulinho quer discutir o texto com o presidente do Senado na próxima semana.
O temor entre deputados federais é de que o Senado volte a derrubar uma proposta aprovada pela Câmara, assim como ocorreu com a PEC da Blindagem. Uma nova derrota exporia ainda mais tanto Motta quanto os outros parlamentares diante da opinião pública.
Aliados acreditam que a Câmara pode retaliar o Senado pelo arquivamento da PEC. Persiste, entretanto, a sensação de que os deputados não conseguiriam contra-atacar. "Dar o troco não depende do Hugo. É o conjunto da Câmara que acabará fazendo, derrotando em votações assuntos que são do Senado", aposta um líder.

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